AMÉRICA XERECA é como uma ópera-r.a.p. contra o réquiem colonial-mono-linguístico neoliberal tatuado como códigos de barra nos corpos e é também algo para além disso, é um poema-orquídea e possui camadas secretas que uma segunda e terceira leituras podem abrir, Uniflora conversa com os territórios domados do antipresente em um discurso que é uma amálgama de fúria, alegria e urgência, este é também um poema-evocação de um despertar e de um levante total, como o desejado e poetizado por Marguerite Duras, Roberto Piva e outras manifestações da vida-toda-poesia.
Escrever, mais do que a arte do futuro, é a arte da defesa de uma utopia que se manifesta nos corpos que não foram sequestrados pelo narcisismo cínico do poder instituído, e esse poemanifesta de Eugênia Uniflora é um grande elogio, tanto das diferenças insurrecionais, quanto de uma linha que une pensamento, sentimento, fala e ato em um gesto multifacetado e indomável plasmado em todo o poema, como aquela pulsação impossível de ser ignorada que foi anteriormente sintetizada no conceito rimbaudiano CHANGER DE VIE/MUDAR A VIDA e que esse livro-poema-manifesta atualiza e contextualiza em uma chave mais ampla, em uma chave-escrita-nos-corpos-do-desejo-por-uma-vida-livre.
— Marcelo Ariel.
Eugênia Uniflora, pseudônimo de Jéssica Iancoski, emergiu no cenário literário com notável destreza e sensibilidade. Em 2021, capturou a atenção do público e da crítica com seu livro de estreia A Pele da Pitanga, uma obra profundamente provocativa, tendo sido finalista do Prêmio Jabuti na categoria Poesia.
Seu segundo livro, América Xereca, reforça sua voz rebelde, explorando temas de decolonialidade e propondo novas maneiras de significar territórios. Eugênia Uniflora escreve para emancipar o povo de convenções inconvenientes, oferecendo perspectivas inovadoras e desafiadoras sobre identidade, cultura e pertencimento.
I.
américa,
eles xeretam
tua xereca
xeretam e enxertam
sementes
de paus
eucaliptos
pinos
seringueiras
xeretam tua prexeca
e injetam
fertilizantes
américa-xereca,
eles fazem cheques
com a tua xeca
*
XIII.
américa latina,
terra sequestrada
e sofrida
teu nome ancestral
é pindorama,
querida
*
XXVI.
américa-pindorama,
por favor,
reaprende a língua
porque
ixé ikewára
asuí ixe rurí
ixe ĩdé yawé
asuí açaiçú ĩdé.
“eu sou daqui
e sou feliz
eu sou como você
e eu te amo.”