“Primeira aparição da manhã” é uma seleção de poemas que compõem a primeira obra literária da escritora Luciana Andradito. Produzidos entre 2008 e 2022, os textos refletem a passagem do dia e os movimentos oscilantes, interiores e exteriores, criando nuances contrastantes entre luzes e sombras. Enveredam pela poesia visual, concreta, erótica, marginal e pelo cordel. Os poemas iluminam as angústias, dores, vazios e mistérios que envolvem a existência, tematizando sobre a inocência, o feminino, os relacionamentos, o obsceno, o escatológico e a metapoesia. Alguns partem da simplicidade e singularidade do cotidiano, outros de regionalismos do norte e nordeste brasileiro. A obra conta com belíssimas ilustrações de Andrey Tamarozzi, concebidas especialmente para o livro e, que ampliam os sentidos da poesia em imagens.
Luciana Andradito é antes de tudo criança que se aninha nas palavras, depois de tudo árvore que estica os braços na direção do sol. No meio, tornou-se retratista de instantes, cartógrafa de sentimentos e mãe de um menino gigante. Nordestina nortista, nascida na Fortaleza de verdes mares em 1989, renascida das palmeiras dançantes do Tocantins. Formada em Teatro pela Universidade Federal do Tocantins. É uma das autoras do texto dramático “Bobarella Desmata-mata”. Como poeta publicou na Antologia Poesia Fora do Eixo 2022, da editora Toma Aí Um Poema, e na Antologia Tocantina – José Gomes Sobrinho 2021. Caçadora de conversas, míope, inventa apelidos com facilidade.
Andrey Tamarozzi é antes de tudo criança, depois de tudo andarilho. No meio, tornou-se serpente, macaco, passarinho. Nascido em Bauru em junho de 1992, renascido em Palmas, desnascido em Ouro Preto, não-nascido em Belo Horizonte e nunca sabe qual será seu próximo destino. É incapaz de separar as atividades de artista-professor-pesquisador, que exerce desde 2010. Flerta com a dança, o desenho e o vídeo. Colabora com os seguintes coletivos: grupo Lizete, grupo Xanarai e L.A.M.A bando. Formou-se em Teatro pela Universidade Federal do Tocantins e é Mestre em Artes Cênicas pela Universidade Federal de Ouro Preto. Suas investigações giram em torno da relação entre corpo e memória. Dúbio, míope, esquece nomes com facilidade.
A MELHOR AMIGA DA DISTÂNCIA
a saudade
tem nome
casa, forma
cor e cheiro
às vezes suave
noutras arremata
e traz com ela uma amiga
a velha dor no peito
umas são de fogo
outras são de água
mas sendo ela quem for
só tem um jeito que passa
passa assim
num abraço de tu com eu
mas volta assim
logo quando desabraça
*
PRIMEIRA APARIÇÃO DA MANHÃ
e foram tantos eu te amo
que o vento tratou de levá-los
falhou, pois levou-os só de um lado
deixando o outro rouco
torto e dolorido
até não poder mais…
vencendo-se o cansaço
o que resta é só lembrança
dias de poucas chuvas no céu
e dilúvios dentro de um corpo só
que pende, se fende
arranha, se estranha
a praia recorda que chegou a hora
de merendar sal grosso
enquanto o vento carrega areia muito fina
o mar agradece a solidão de cada um
e uma criança faz castelos de areia
só porque para ele ser só-sozinho é mais triste
e logo cai a noite
não demora muito
ele não dorme
e só.
um beijo salgado nos olhos
os dois.