A dança áspera das raízes é um livro de poemas escrito entre 2021 e 2024. Os poemas perpassam a morte, a água e a terra e, por isso mesmo, a vida e o desejo, aquilo que permanece pulsando. A ausência de títulos nos poemas reflete uma escolha estética presente também nos trabalhos anteriores da autora, reforçando a ideia de um fluxo contínuo dentro do território poético.
Bárbara Mançanares é historiadora, poeta e bordadeira. Autora dos livros "Maio" (Quintal Edições, 2018), "Cartografias do corpo que canta" (Editora Patuá, 2021) e "A voz incauta da feras" (Editora Patuá, 2024), foi vencedora do Prêmio Nacional Mozart Pereira Soares de Literatura (2023) na categoria melhor livro de poesia. Foi aluna do Curso Livre de Preparação de Escritores (2021) do Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura e em 2024 foi selecionada no edital Rumos, do Itaú Cultural, para escrever seu primeiro romance.
os elefantes dormem de lado
parecem caminhantes de uma dança lenta
coreografada no chão da savana
as raízes ainda mais profundas
como tem de ser as coisas afeitas ao tempo
nunca imaginei animais dormirem
exceto você
enrolado sobre o próprio corpo
a respiração inabalável pela manhã
quando se sonha e
sobretudo
quando se cansa ao sonhar
eu sou o elefante-da-savana
cavo buracos crio nascentes
carrego por vinte e dois meses
um embrião de marfim
me deito ao seu lado como se deitam as fêmeas
invisíveis e silenciosas
a maior dos animais terrestres
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algumas palavras soam como todas as outras
se repito à exaustão navio ou
nada
se repito à exaustão o léxico nas minhas digitais
se lê um tempo em que tudo é marulho
diferente de quando eu ou você
deitávamos a cabeça sobre as conchas
ou quando soprávamos suas fendas
e ali já não era o mar, mas um princípio de terra
digo, não comer ou matar a galinha
conjurá-la
porque algumas palavras, realmente
algumas palavras não soam como todas as outras
mas como a origem do som em uma folha em chamas
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não se enterra um pai como se enterra
hortênsias
bolas de gude
umbigos de bebês
a raiz de certas ervas
um desejo escrito com tinta azul
não se enterra um pai como se varre
a poeira resfolegada nos batentes
os grãos de café nos terreiros
as linhas no chão da casa de uma costureira
não se enterra um pai como se observa
a troca de pele das cobras
os espinhos na língua dos gatos
a forma como uma baleia surda sobrevive solitária no Pacífico
se enterra um pai como se enterra
um pássaro de chumbo
os dedos inábeis dos filhos vasculhando na terra
qualquer definição para a palavra casa
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