Nasci num mundo desigual. Paulistano de 86, percebi esse fato logo cedo (mas não tão cedo), apesar da inocência não me apontar a verdade no obscuro da naturalidade, dos rompimentos que nos divide: cor, credo, gostos…
Pouco a pouco cresci e notei as cores tomando significados de bom/bem ou de
mau/mal. Procurei por curiosidade a árvore genealógica e me deparei com a limitação no conhecimento dos que me antecedem. Todavia, em todos os silêncios de fugas paternais, de reconhecimento social, ou mesmo da ausência de registros, me remetiam ao passado negro. Negro na condição pré-conceituada da palavra, e
também da origem racial, seja paterna ou materna.
Me indaguei sobre os conhecimentos acerca da luta histórica do negro. Espantei com a displicência atual das origens e da continuidade.
Aos trinta anos, residindo no interior oeste baiano, tive acesso a uma casa histórica.
Esta havia sido uma casa de senhores de escravo que resistira ao tempo, mantendo-se firme, com estruturas de uma madeira forte (com certeza construída no lombo negro). Assustei quando internei verdadeiramente o que víamos nos livros didáticos da escola. A escravidão não estava longe como meu pensamento erroneamente pintava, quase qual uma lenda contada a meninos. O vácuo na árvore genealógica ganhou cor!
Em nova oportunidade, as madeiras fortes deram lugar a um espaço sombrio, no qual me neguei a entrar. Nele, correntes e bolas de ferros ainda estão no local. Uma lembrança amarga, que faz do ambiente um peso na alma, gritante aos ouvidos como assombro de tempos difíceis.
A minha experiência é uma pequena parcela, na história de lutas e resistência do povo negro, que é uma história composta por capítulos, independente de qual área geográfica ou época se situe.
Logo, este trabalho é o resultado dos esforços em produzir uma reflexão inicial à
leitores e quiçá a educandos. Esta não se apresenta como verdade absoluta, mas
fomenta em versos não limitados (como o negro não é) o questionar, incitando a crítica individual, para nos enxergamos na história e descubramos se a liberdade é um mito, ou uma possibilidade de um troféu definitivo ao qual fazemos parte na luta.
Cidiclei Leite da Silva, negro, casado, pai de duas filhas, cristão. Nascido em 1986,
natural de São Paulo, capital, extremo Sul, formou-se em Serviço Social no ano de
2013. Mudou-se para Bahia em 2005, onde atua na Saúde Pública de Oliveira dos
Brejinhos, cidade do oeste baiano. Membro na Primeira Igreja Batista de Oliveira dos Brejinhos, possui cosmovisão cristã de integralidade do homem: espiritual, físico e social.
Contínua Luta
O mundo segue seu ritmo e suas desculpas
Muda a falácia e quem a imputa
Mantém-se as mentiras de políticas fajutas
Encobrindo por receio da verdade absoluta
Entorpecido não ouve, apenas escuta
O eco no tempo originado na luta
Que influencia a postura e uma nova conduta
Que o mito da liberdade em gerações se incuta
Questionando os nós, e seus impactos discuta
Os ensinos errôneos, a história refuta
O mundo segue seu ritmo e suas desculpas
Temos no palco do hoje o cenário da contínua luta!
*
Noite Livre
[...]Chibata cantou na noite.
Na noite cantou chibata.
Mas a noite não consegue explicar:
Se, chibata já não há,
Porque a noite não faz seu próprio canto?
Se não se escutam mais os estalos,
Porque ainda se vê o suor vermelho?[...]
*
O que é liberdade?
[...]Liberdade.
Traga-me o calor dos teus braços,
O sabor dos teus beijos,
O cheiro do teu perfume.
Vem, me assume![...]
*
O mito da liberdade
[...]Lhe tenho comigo e não a posso só para mim
Entendo o que eu preciso, guardo assim o seu sorriso
Reluzente em formosa face
Ela nada disse, a não ser seu nome:
- Prazer, me chamo Liberdade![...]