Troar é um estalido de fogo, uma crepitação, um sussurro, um grito, um gemido, um suspiro e um pensamento em silêncio; é um ensaio, uma dança, um tropeço brusco em sonho, uma escuta atenta de olhos fechados, um farfalhar de árvores ao vento, um marulho; é um verso desnaturado, uma queimadura e seu curativo; é um bando de libélulas numa poça d’água, uma fonte, um riachinho e uma lágrima de gozo, de riso ou de tristeza profunda; é a vibração de cordas de uma palavra tesa; é um arranjo de flores mortas e seu aroma vivo; é a agulha que perfura a pele e trama um novo bordado ressoando um som antigo; é um sufoco, um giro e um arrependimento doído; um cochilo e uma gota de sangue; um furacão que gira feito peão na palma da mão; um transe, uma transa, o som de uma orquestra no deserto do medo; um navio submerso desabitado de conchas vazias; um deslize de placas tectônicas sem repercussão; uma inconsequência; o delírio de uma poeta louca; paisagens de estações de trem e do tempo; passagens sem ida e sem volta; o ponto de inércia em uma queda; a face exposta da lua nova: um livro para ninguém ler.
Monique Lima é educadora, letrista de música, artista de rua e de rádio.
Filha, neta e bisneta da classe trabalhadora potiguar, pernambucana e capixaba, criada no subúrbio da Avenida Brasil, no Rio de Janeiro e nascida na Baixada Fluminense.
É socióloga, jornalista, pesquisa e atua com cultura e política. Autora de doravante (Arpillera, 2023).
árvores
de nomes riscados
atlânticos sem passado
A ilusão biográfica
aos troncos partidos
não se aplica.
_é que faz tempo que a boiada passa!
Assino Lima
e o constante desafio
de ser fruto de Oliveira
e flexão de verbo
*
de pedra
da soleira de pedra,
quantos já vimos passar?
Quantos passarão?
Ser pedra é testemunhar
tudo o que vai
e tudo o que virá.
Minerais sobrepostos em degraus
que dão à porta que já não abre.
A casa desabitada.
Caminho para nenhum lugar.
Da soleira de pedra não se chega e não se sai.
As ruínas da casa que poderiam abrigar,
aguardam a demolição.
As vidas nas grandes cidades,
ou são desalojadas,
ou ricas.
Eu passo,
vocês todos passam.
A soleira fica.
*
em Paquetá
do meu ponto de vista,
são dois sóis.
Faz calor.
Transpiro e o suor é de mar.
Transito entre ruínas de outro tempo,
sonhando o futuro.
Do meu ponto de vista,
não sei o que há
e essa incerteza
é o bem maior que tenho
e que posso querer.